20/11/2021 - Redação
Três adolescentes foram resgatadas de condições análogas às de escravo em uma casa de farinha em Marcolândia, no Piauí, em operação que terminou nesta quarta (17). Elas descascavam a mandioca para ser processada, atividade relacionada na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil. A ação ocorre no momento em que a Câmara dos Deputados discute a redução da idade mínima permitida para o trabalho.
A operação do grupo especial de fiscalização móvel contou com a participação de auditores fiscais do Ministério do Trabalho, procuradores do Ministério Público do Trabalho e do Ministério Público Federal, agentes da Polícia Federal e um membro da Defensoria Pública da União.
Ela verificou a situação de oito farinheiras em Marcolândia (PI) e Ipubi (PE). Em apenas uma delas foi caracterizada escravidão contemporânea devido à degradação do trabalho das adolescentes. Mas sete das oito empresas tiveram seu maquinário interditado por conta da falta de segurança.
As três adolescentes, de 13, 15 e 17 anos, trabalhavam para ajudar a renda da família. De acordo com o auditor fiscal do trabalho Claudio Secchin, que coordenou a operação, cada uma descascava, usando faca e raspador, cerca de quatro tonéis por dia, ajoelhadas, sentadas num toco de madeira ou encostadas na parede. Elas mudavam de posição a cada tanto devido à posição desconfortável e as dores do esforço repetitivo.
Foram cinco meses de trabalho ininterrupto. Não contavam com banheiro, tinham que trazer seus próprios instrumentos de trabalho e não recebiam equipamentos de proteção individual. Vale lembrar que a intensa dispersão de poeira oriunda do processamento da mandioca pode causar problemas respiratórios..
Cada uma das adolescentes recebeu R$ 8620,00 em verbas rescisórias e dano moral individual. E terão direito a três meses do seguro-desemprego especial pago a resgatados do trabalho escravo no Brasil desde 2003. Os empregadores firmaram Termo de Ajuste de Conduta com o Ministério Púbico do Trabalho, comprometendo-se a se adequar à legislação.
A Casa de Farinha São Cristóvão onde foi identificada as condições análogas às de escravo se comprometeu perante ao MPT e à DPU ao pagamento de cestas básicas para as famílias das adolescentes e outras famílias do município onde elas moravam.
A coluna não conseguiu contato com os responsáveis pela empresa até o fechamento deste texto e irá atualizá-lo tão logo isso ocorra.
Trabalho em casa de farinha é proibido para crianças e adolescentes
A legislação brasileira proíbe quem tem menos de 18 anos de atuar em atividades relacionadas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), de acordo com o decreto 6.481/2008. Ele regulamenta a Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho que trata do tema.
De acordo com a Lista TIP, a atividade da fabricação de farinha de mandioca envolve esforços físicos intensos, acidentes com instrumentos pérfuro-cortantes, movimentos repetitivos, temperaturas altas. Entre os prováveis riscos à saúde estão contusões, cortes, queimaduras, amputações, tendinites, entre outros.
O flagrante de crianças e adolescentes trabalhando nessas condições não é novidade nessa região. Por exemplo, 13 crianças e adolescentes, de três a 17 anos, foram encontrados em três casas de produção de farinha de mandioca no município de Ipubi, sertão de Pernambuco, pelo grupo móvel de fiscalização do governo federal em maio de 2019.
Depois disso, a situação melhorou, mas não o suficiente. A criança começa a trabalhar porque a família não tem com quem deixa-la ou porque precisar de sua ajuda para completar a renda da casa. Ou seja, é um misto de falta de alternativas econômicas para emprego na região aliada à falta de estrutura de assistência social.
Fonte: UOL